Avaliação processual: o raio X do ensino e da aprendizagem na sala de aula |
Escrito por: Bruna Nicolielo | Retirado do NOVAESCOLA | Todos os créditos.
Você já ouviu falar em avaliação processual? Sinônimo de avaliação formativa ou contínua, ela indica a prática de examinar a aprendizagem ao longo das atividades realizadas em sala de aula: produções, comentários, apresentações, criações e trabalhos em grupos. “Isso faz a diferença porque é o elo entre o ensino e a aprendizagem e torna o docente corresponsável pelo processo”, afirma Benigna Villas Boas, professora da Universidade de Brasília (UnB) e autora de, entre outros livros, Virando a Escola do Avesso por Meio da Avaliação (144 págs., Ed. Papirus, tel. 11/ 2125-3900, 42,90 reais).
Avaliar dessa maneira permite acompanhar a construção do conhecimento, identificar eventuais problemas e dificuldades e corrigi-los antes de avançar. “Isso ajuda a interpretar o que a turma aprendeu ou não e, assim, intervir, mudando as estratégias”, explica Jussara Hoffmann, autora de livros como Avaliação Mediadora: Uma Prática em Construção da Pré-Escola à Universidade(160 págs., Ed. Mediação, tel. 51/3330-8105, 24 reais).
Deveria ser assim sempre, mas em muitas salas de aula ainda predominam provas classificatórias, que servem como instrumento de poder e domínio do docente e deixam para o aluno toda a responsabilidade pelo resultado. “É importante que os educadores abram mão de avaliações tradicionais e coloquem esse recurso realmente a serviço da aprendizagem”, continua Jussara.
A rotina atribulada e a formação deficitária dos docentes são aspectos que dificultam a adesão a propostas diferenciadas. “Isso resulta em falta de preparo para estimular uma cultura avaliativa que não seja excludente e punitiva”, comenta José Albertino Carvalho Lordelo, da Universidade Federal da Bahia (UFBA). Apesar dos obstáculos, é perfeitamente possível colocar essa nova visão em prática. “Antes de mais nada, o professor precisa ter muita clareza de seus objetivos”, ressalta Denise Tonello, orientadora pedagógica e educacional do Colégio Miguel de Cervantes, em São Paulo. Segundo ela, um passo importante é criar o hábito de registrar o que se passa na sala. “Sem isso, informações preciosas podem se perder”, explica Elisabete Montagner, formadora de professores do Sesi, em São Paulo. É possível anotar falas significativas, o desempenho e as dificuldades apresentadas pelos alunos, a participação geral e tudo o mais que ajude a ter um perfil claro da turma e que facilitará saber onde, como e quando intervir. “Fichas de acompanhamento facilitam o trabalho com classes numerosas”, diz Elisabete.
A atribuição de nota não é um problema, pois as escolas e as redes às quais estão vinculadas, de um modo geral, costumam adotá-la. Na avaliação formativa, porém, ela não ocupa lugar de destaque. “Trata-se de um parâmetro, decorrência do processo”, diz Benigna.
Outro ponto fundamental é diversificar os procedimentos, sempre pensando em criar desafios para a garotada. Nesse sentido, um forte aliado em todas as etapas de ensino é o portfólio. Ele pode reunir as produções mais significativas do estudante ou do grupo. “Esse material não é simplesmente uma coleção do que o estudante fez. Ele deve indicar o percurso de aprendizagem”, defende Célia Maria Guimarães, professora da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (Unesp) e coautora do livro Fundamentos e Práticas da Avaliação na Educação Infantil (Ed. Mediação, no prelo). O portfólio permite ao professor ter uma visão mais ampla dos resultados e ao aluno fazer reflexões sobre o que sabe. Ele mesmo pode escolher o que será incorporado à pasta, num processo de tomada de consciência sobre o que foi aprendido e o que ainda falta aprender.
Nas páginas seguintes, estão três sequências de atividades de professoras que aderiram à avaliação processual. Você lerá o exemplo da autoavaliação feita pelos pequenos na pré-escola, da avaliação entre pares nos anos iniciais e da produção intensa de textos nos anos finais. Lembre-se, no entanto, de que as práticas avaliativas não são exclusivas de uma faixa etária ou outra. Elas devem sempre se adaptar às disciplinas, ao conteúdo que está sendo trabalhado e às características e necessidades da turma em questão.
Crianças de 5 anos avaliam desenhos
Qual atividade você mais gostou de fazer
neste trimestre? Por quê?
“Eu adoro fazer desenhos livres, porque
eu posso desenhar o que quiser. Gosto
de desenhos demorados!” (Julia)
Na Educação Infantil, o comportamento, o movimento e a expressão corporal são elementos que você deve observar para alimentar sua reflexão. Mas a avaliação pode ir além disso. Em pesquisas com crianças de 5 anos, Leonor Santos, da Universidade de Lisboa, em Portugal, constatou que elas são capazes de se autoavaliar, identificando pontos fortes e o que precisa ser melhorado. No Colégio Miguel de Cervantes, em São Paulo, a professora Renata Labonia propõe esse tipo de ação em dois momentos. O primeiro é uma reflexão sobre o dia. Todos, em roda, conversam sobre o que realizaram com base nas perguntas da educadora. Nessa hora é comum que um complemente a fala do outro.
Além disso, a cada mês, os pequenos participam da escolha das produções que serão acrescentadas ao portfólio individual, um material levado para a reunião de pais e, depois, para casa. Também em uma roda, Renata expõe tudo o que foi produzido pela turma, que tem 29 crianças de 4 e 5 anos. “Olhamos tudo e vamos lembrando o que cada um fez”, conta.
“As crianças que ainda não escrevem podem ser estimuladas a se avaliar oralmente ou por meio de desenhos, que dizem muito sobre o desenvolvimento. Essa prática enriquece a pasta”, explica Denise, do Miguel de Cervantes. Durante a discussão, Renata anota as justificativas apresentadas pelas crianças para suas escolhas. Depois, essas frases são adicionadas ao portfólio.
Sondagem Os bonecos-palitos eram comuns nos desenhos da turma. Para trabalhar a figura humana, então, Renata pediu que cada um se desenhasse. A etapa avaliativa balizou os passos seguintes.
Exploração Todos dançaram em frente ao espelho observando o corpo. Depois, uma criança desenhou a outra. E os pequenos ainda fizeram o contorno do corpo dos colegas em papel Kraft.
Referências A garotada conheceu obras de pintores e escultores como o francês Henri Matisse (1869-1954) e as brasileiras Lygia Pape (1927-2004) e Lygia Clark (1920-1988).
Produção Em um novo desenho, o boneco-palito do início do ano deu lugar a formas humanas cheias de detalhes. Olhos, sobrancelhas, cílios, cabelos, dedos e pescoço foram desenhados com afinco. O aprimoramento foi notado e destacado pelos pequenos no momento de montagem do portfólio.
No 3º ano, os pares indicam melhorias
Escola Municipal Ezelita Souza Vieira Turma 3ºA Data 08/10/2013
Aluno (a) Samira Oliveira Brandão Professora Eunice Pereira Barberino
A Cigarra e a Formiga
Era uma vez a cigarra e a formiga. A cigarra so cantava incuanto a formiga so trabalhava. Quando chegou o inverno a cigarra foi a casa da formiga. A cigarra ficou com frio. Foi a casa da formiga. Bateu na porta toque toque Quei e Sou eu a cigarra a cigarra respondeu: oi quero que mi alimente Estou com muita fome e com muito frio. O que você fez durante o verão eu cantei
Pois agora dancê!
Moral: Primeiro a obrigação depois a diversão
Para começar uma fala precisa de travessão –
Antes de uma conversa usa dois pontos :
Comentários da aluna Luciana Cardeal Reis
A prática de uma criança analisar a produção de outra e propor melhorias foi estudada pela pesquisadora argentina Mirta Castedo em sua tese de doutorado. Ela concluiu que estudantes entre 7 e 9 anos são capazes de travar longas discussões entre si sobre suas produções. “As opiniões dos outros multiplicam as visões sobre o escrito. Discutir o produzido é favorecer uma análise mais além do que cada um, individualmente, é capaz de analisar”, escreve.
Essa estratégia é adotada por Eunice Pereira Barberino com o 3º ano da EM Professora Ezelita Souza Vieira, em Tapiramutá, a 360 quilômetros de Salvador. Em um projeto de reescrita da fábula A Cigarra e a Formiga, a professora organizou duplas com níveis de conhecimento próximos e um aluno avaliou o texto do outro. “Dessa maneira, todos aprendem a ter uma postura de ler para escrever melhor”, diz Benigna, da UnB.
Esse procedimento foi apenas uma das estratégias de avaliação utilizadas por Eunice, que ainda contemplou análises dos textos produzidos e muita observação. Para registrar tudo o que acontecia, ela elaborou fichas com questões sobre tópicos específicos como: “Escreve inicial maiúscula após pontuação?” e “Revisa os textos após diferentes versões?”. A cada dia, ela elegia novos grupos e conteúdos a observar. “Com isso, pensava em atividades diferenciadas para quem ainda não havia aprendido.”
Diagnóstico Eunice questionou o que a turma sabia sobre a história e pediu que cada um escrevesse seu texto. Depois, todos conheceram várias versões da fábula e fizeram um reconto oral.
Troca Os alunos produziram novas versões da história e, depois, a classe foi dividida em duplas para a revisão. Um estudante sugeriu melhorias no texto do outro, sem reescrever pelo colega. A professora percorreu os grupos registrando as observações e fazendo apontamentos.
Ajustes Para sanar dificuldades identificadas, a educadora propôs atividades sobre sequência narrativa, paragrafação, ortografia, pontuação e acentuação.
Produto final Depois de todos refletirem sobre a escrita e produzirem vários textos, as versões finais foram reunidas em um livro, lançado com a participação de toda a comunidade.
Produções de texto são analisadas no 8º ano
À medida que crescem, os estudantes podem ser desafiados a escrever textos cada vez mais complexos e ser avaliados por isso. “O resultado dessa diversidade de propostas é um portfólio mais rico, que ajuda na retomada do aprendizado tanto pelo aluno como pelo professor”, diz Célia, da Unesp. Outro ponto importante é envolver a turma no processo avaliativo. “É preciso explicar o que se espera que as produções revelem, qual é o objetivo do docente e o que ele quer saber se o estudante aprendeu”, explica Elisabete, do Sesi. Foi assim que agiu a professora de História Márcia Olinda Julio, da EE Antonio Raposo Tavares, em Osasco, região metropolitana de São Paulo.
Num projeto com o 8º ano sobre os desdobramentos da chegada da família real ao Brasil, ela propôs uma série de atividades que permitiram observar o que os alunos sabiam ou não sobre o tema estudado. Após as primeiras aulas, houve a produção de diálogos e de cartas fictícias entre as personalidades históricas envolvidas no conteúdo. O objetivo de Márcia era identificar os conhecimentos da turma sobre os principais atores desse período, bem como suas ações. A docente leu os textos dos 70 alunos (são duas classes de 35), devolveu as produções e fez um comentário coletivo para cada turma. Todos receberam nota, uma exigência da escola.
Nas etapas seguintes, os adolescentes fizeram provas dissertativas e relatórios sobre os livros e filmes apresentados. Nessas produções, abordaram o desenvolvimento econômico e o fortalecimento político que levou ao rompimento com a metrópole em 1822 e a instauração do Primeiro Reinado. A garotada também produziu videodepoimentos sobre o que viu no Museu Paulista, em São Paulo. Os trabalhos trataram do mobiliário e de outros utensílios dos imperadores e foram analisados pela professora, que ainda fez uma discussão sobre as produções em sala.
A classe também foi a Paranapiacaba, distrito de Santo André, região metropolitana de São Paulo, onde viu a estrada de ferro que transportava cargas e pessoas até o porto de Santos, a 80 quilômetros de São Paulo. Após a viagem, um novo videodepoimento foi feito e avaliado. Nessa segunda produção, os estudantes incorporaram as sugestões feitas por Márcia. “O resultado ficou visivelmente melhor, tanto do ponto de vista técnico como do conteúdo que estávamos abordando”, comenta a docente.
Por fim, ela ainda avaliou um memorial – texto individual que é uma espécie de diário retrospectivo – produzido com base em anotações dos adolescentes sobre a palestra com a arqueóloga Valdirene do Carmo Ambiel, responsável pela exumação do corpo de dom Pedro I (1798-1834) e de suas mulheres. O estudo revelou aspectos até então desconhecidos, como o fato de o imperador jamais ter fraturado a clavícula em uma queda de cavalo, o que era tido como verdade.
As produções mais significativas foram reunidas no portfólio. Trabalhar com esse recurso nos anos finais também é possível. É preciso apenas ficar atento à abrangência dele. Pode-se escolher um tema ou um projeto específico. “Não é necessário desenvolver o trabalho com todas as classes ao mesmo tempo. Ao terminar um projeto numa sala, vale começar em outra e assim por diante. Desse modo, todos os estudantes vivenciam esse procedimento e o professor não fica atribulado demais”, diz Benigna, da UnB.
Querido Dom Pedro,
É verdade que abdicará sua coroa a favor de seu filho D. Pedro II, pense nisso com calma Pedro é apenas uma criança, e desde que Maria Leopoldina faleceu, não tenho noticias de como anda sua vida conjugal, espero que não ande traindo sua esposa Dona Amélia.
Sei muito bem que assim como sua mãe Carlota Joaquina, a fidelidade não é uma virtude que você possue. Além de tudo quer proclamar a republica, você sempre teve essas ideias revolucionárias na cabeça, as vezes acho que é louco mas sei que sempre quis fazer o melhor.
Estou sentindo muitas saudades de você a última vez que te vi foi em uma pequena viajem ao Brasil, espero mesmo revê-lo, e tentar colocar sua cabeça no lugar. Se tomar a decisão de por Pedro em seu lugar sei que será o melhor, além do que ele faz parte da família, e foi bem educado e preparado, quando chegar a hora ele será um bom rei.
Cuide de sua saúde, o histórico familiar não é nem um pouco bom, ao contrário de seu tio D. José não deixe que alguma doença acabe com sua vida.
Trate dos assuntos politicos com seriedade, calma, e de sua família com amor e atenção, e por favor tente ao máximo não ter preferência por um dos filhos, já vimos que isso não da em boa coisa.”
De sua prima e amiga de sempre, Valentina
Leitura A turma leu 1808 (Laurentino Gomes, 408 págs., Ed. Planeta, tel. 11/3087-8888, 39,90 reais) e assistiu Carlota Joaquina, Princesa do Brazil (Carla Camurati, 100 min).
Cartas A professora selecionou algumas personalidades da época – como Carlota Joaquina (1775-1830), dom Pedro I e Napoleão Bonaparte (1769-1821) – e propôs a produção de diálogos e, em seguida, cartas endereçadas a eles. Com isso, ela verificou o que a turma havia entendido nos estudos realizados nas aulas anteriores.
Saída a campo Antes de ir ao Museu Paulista, a turma analisou o quadroIndependência ou Morte, de Pedro Américo (1843-1905), e fez novas leituras. Depois, cada um produziu um vídeo.
Aprofundamento Os estudantes viram Mauá – O Imperador e o Rei (Sérgio Rezende, 135 min, Europa Filmes) e fizeram um relatório. Paranapiacaba foi tema de mais um vídeo.
Saber acadêmico A docente introduziu o tema que uma arqueóloga convidada iria abordar. Na palestra sobre a família imperial, os estudantes puderam tirar dúvidas e também tomar notas.
Memorial O texto final feito por cada um reuniu as anotações sobre a palestra e todas as etapas. Considerado pela docente, o trabalho compôs, com os demais, a nota final.