Escrito por: Regina Scarpa
Entre as atividades da didática da alfabetização, há duas que todo professor – mesmo um iniciante – pode lançar mão imediatamente: a primeira é ler todos os dias para as crianças. A segunda é deixá-las escrever. Vejo a presença de livros e as práticas de leitura mais consolidadas em nossas escolas. As de escrita, ainda não.
Pensando nisso e tendo a sala de aula como inspiração, viajei de volta a 1999. Lembrei de uma proposta na pré-escola em que atuei como coordenadora. Entre os espaços de atividades diversificadas na sala, montamos o cantinho da escrita. Era simples: uma mesinha com letras móveis, todo tipo de caneta, máquina de escrever, envelopes, papéis de carta, folhas grandes, lápis pretos – enfim, tudo para ser um lugar em que os pequenos tivessem vontade de escrever.
Vovó Lelena, eu posso ir na sua casa?” é o pedido de Maria Eduarda |
E que vontade! As crianças escreviam livremente, de acordo com suas hipóteses sobre o sistema de escrita. Também trocavam ideias e conversavam sobre as grafias mais adequadas. A professora passava e fazia intervenções: “Para quem você vai escrever?”. Se fosse para um pai ou outro familiar, o texto seguia para um envelope com nome no varal da sala. Quando os parentes viessem buscar a criança, podiam retirar também a mensagem. Lembro a alegria da “vovó Lelena” ao receber o bilhete que ilustra esta coluna…
Faz toda a diferença deixar os pequenos escrever do jeito deles, da melhor forma que podem, segundo as ideias que possuem sobre a escrita no momento. Eles são levados a pensar em quais letras colocar, quantas letras colocar e em que ordem colocar. Essa reflexão sobre o sistema de escrita as leva a avançar, mesmo quando o professor não pode fazer as melhores intervenções.
No entanto, propostas desse tipo ainda sofrem resistência. Há, sobretudo, o receio da avaliação dos pais, que querem ver os cadernos de seus filhos com a grafia correta. Em vez de se acomodar com as atividades de cópia, vale muito explicar a importância da escrita não convencional das crianças e o processo pelo qual elas aprendem. Essa incursão na “liberação da escrita” – isto é, permitir que as crianças escrevam fora das amarras da cópia – tem efeitos positivos na aprendizagem e é uma conquista para os professores.
Ao mesmo tempo, eles vão descobrindo que se deve fazer algo mais do que apenas contemplar e aceitar as hipóteses de escrita das crianças. Não se pode ficar só na sondagem. É preciso planejar atividades com intencionalidade e saber intervir para ajudar os pequenos a avançar. Deve-se levar em conta os conhecimentos que possuem como critério para a organização de interações produtivas para as atividades de leitura e escrita. Mas, antes de tudo, vamos deixar as crianças escrever! Esse é um aspecto importante para a formação de professores alfabetizadores.
Fonte: Nova Escola