Reprovar é dizer ao aluno que ele não precisa concluir o Ensino Médio:
Nessa semana, o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) divulgou os indicadores de transição escolar, o que não ocorria desde que a forma de publicação do Censo Escolar mudou em 2007.
Um golaço do Inep. Esses dados são importantes, pois apontam o que acontece com os alunos entre um ano letivo e outro. Eles apontam se um jovem que fez uma determinada série em um ano estudou em uma série adiante (promoção), na mesma série (repetência) ou se não se matriculou (evasão) no ano seguinte. Portanto, apontam onde “perdemos” os estudantes.
Essas informações estão muito correlacionadas com os indicadores de rendimento, o que faz com que haja muita confusão entre eles. Os indicadores de rendimento apontam se em um ano letivo os alunos foram aprovados, reprovados ou se abandonaram ao longo do ano. Os indicadores de rendimento em um ano letivo, por consequência, afetam muito os indicadores de transição do ano seguinte. Mas isso não significa que sejam sinônimos!
Reprovação não é repetência e abandono não é evasão. A reprovação é uma decisão da escola/sistema educacional, enquanto a repetência é uma decisão do aluno ou de sua família. O abandono reflete um aluno que desistiu naquele ano, enquanto a evasão reflete um aluno que sequer se matriculou na série. E quase 13% dos alunos que deveriam fazer o 1º ano do Ensino Médio não se matricularam em 2015.
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Mas como assim “os alunos não são matriculados”? Esse cenário – que deveria gerar incredulidade – não tem responsável, alguém que cuide para que ele não aconteça. O abandono tem um “dono”, já que há uma escola em que o aluno estava matriculado. Não é o caso da evasão. Afinal, quem corre atrás do aluno que não se matriculou?
Para piorar, a lei só fala em obrigatoriedade de estudo dos 4 aos 17 anos de idade, sendo que muitos alunos que estão no Ensino Médio já têm pelo menos 18 anos. E por que têm mais de 17 anos? Culpa da reprovação. Veja bem: reprovação, não repetência. Pois queremos que os alunos reprovados façam a série novamente e não saiam da escola. É isso que acontece?
Mais ou menos. A reprovação é muito mais comum que o abandono no Ensino Fundamental, assim como a repetência é muito mais alta do que a evasão. Isto aponta que, apesar das taxas de reprovação, os alunos normalmente persistem no Fundamental. O jogo muda no Ensino Médio. A repetência, que era muito mais forte do que a evasão, passa a ter índices mais baixos. O “tiro de misericórdia” é o 1º ano do Ensino Médio com a maior taxa de reprovação da Educação Básica, o que certamente influencia o fato de este ano ter também a maior taxa de abandono escolar. Enquanto isso, a evasão é recorde nos dois primeiros anos do Ensino Médio.
Na prática a reprovação do primeiro ano do Ensino Médio se configura como a escola dizer que o aluno “não precisa ficar”. É duro afirmar isso, mas é esse o cenário. Muitos desses reprovados não têm nem sequer uma lei que os diga para ficar na escola, lembrando que a obrigatoriedade é de 4 a 17 anos. Mas que não se culpe só as reprovações do Ensino Médio, pois as reprovações, mesmo que no Ensino Fundamental, acabam por afetar que muitos alunos não concluam o Ensino Médio.
Logo, faço a pergunta aos professores que reprovam muitos alunos: o que querem quando reprovam um aluno é que ele não conclua o Ensino Médio? Eu não acredito que querem isso, mas esse é o resultado que estamos conseguindo com as reprovações. Então, se queremos uma Educação Básica completa para todos, precisamos fazer um bom acompanhamento da aprendizagem e recuperação das defasagens de aprendizado ao longo do ano letivo, o que se passa obviamente por se garantir melhores condições de ensino para as escolas do país.
Os dados do Ensino Médio são claros: os alunos, principalmente os mais velhos, não querem tentar de novo. Reprovando, estamos dando uma carta aos alunos dizendo que não precisam concluir a Educação Básica. Se queremos que fiquem, precisamos tentar de tudo ao longo do ano letivo. E, nessa luta, é covardia os professores estarem sozinhos! Os pais, a comunidade, os gestores escolares e os gestores de redes precisam dar todo o suporte possível, pois uma Educação só é de qualidade se é para todos.
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Por: Ernesto Martins Faria, da Fundação Lemann
Fonte: Nova Escola