Em Natal filho de 11 anos ensina mãe catadora de lixo a ler e escrever. Para muitos de nós, o ato de ler e escrever é algo cotidiano e quase automático, mas existem milhões de pessoas que ainda não foram alfabetizadas.
A história de vida da dona Sandra Maria de Andrade é marcada pelo abandono, a violência e muita superação, como a de várias mulheres brasileiras, principalmente das camadas mais pobres e menos assistidas pelo Estado. Aos 13 anos, ela foi abandonada pela mãe e depois entregue pela avó para um casal que não deixou a menina estudar, ou seja, ela nunca teve a oportunidade de aprender a ler e escrever. Sandra trabalhou na lavoura antes de fugir e viver nas ruas comendo sobras de alimentos que encontrava no lixo.
Um pouco mais velha, ela foi morar com um homem em troca de comida e um teto para morar. A vida parecia melhorar, mas só piorou. Sandra era espancada pelo homem constantemente. Em 1996, após o agressor golpeá-la com facadas e arrancar seu cabelo, Sandra fugiu, mais uma vez, com os três filhos que teve com o homem. “Com fé em Deus, se sua mãe escapar, macho nenhum bate mais nela”, prometeu.
Hoje, ela mora em uma pequena casa numa rua de areia no Jardim Progresso, na periferia de Natal, no Rio Grande do Norte. Sem nunca ter podido estudar, ela começa a dar os primeiros passos no mundo das letras. E graças ao filho Damião, de apenas 7 anos de idade, do seu segundo relacionamento.
Tudo começou há um ano, com as histórias que o filho lia para ela. “Mãe, mãe, quer ler comigo? É uma historinha. E tem figuras”, dizia para incentivá-la. Em seguida, o menino começou a ensinar as letras do alfabeto.
Aos poucos, a mãe aprendeu a decifrar as letras do alfabeto e a se desfazer do trauma que tinha com a letra “e”. Sempre que via a letra ela ficava apavorada, pois confundia o “e” com outras letras. Damião teve que desenvolver uma didática própria para sanar as dúvidas.
O filho explicou que o “e” era o mesmo que um “i”, só que fechado e sem ponto. O “h” virou uma cadeirinha e o “R” o mesmo que um “B”, mas fechado. Foi assim que o menino ensinou as letras do nome dele e as letras do nome dela, até Sandra aprender a escrever. “Quando eu aprendi, disse: vou fazer outra identidade que é pra quando chegar nos cantos eu dizer: eu sei fazer meu nome. Pra mim, já era tudo eu saber. Chegar lá, o povo dizer assine aqui e eu dizer: agora eu já sei ler e escrever, não sinto mais vergonha”.
O filho-professor continua ensinando a mãe, pois quer que ela aprenda mais, e mais. “Eu quero ver ela aprendendo comigo. Quero que aprenda as palavras que ela sente aqui dentro. Ela gosta de falar amor, paixão. Já sabe um monte de palavras. Ela sabe as mais simples”.
Em apenas um ano, Sandra leu 107 livros. Um número impressionante, já que os brasileiros leem em média quatro livros por ano, segundo uma pesquisa do Ibope. O livro que ela mais gostou é “Ninguém nasce genial”, do escritor Sérgio Vieira Brandão. “Escrevi meu nome nele. Porque ninguém nasce gênio. Porque eu achava que não precisava mais saber, achava que era tarde pra saber”.
Para Damião, o livro mais impactante conta a história de um anjo que vivia acorrentado e só conseguiu se libertar quando ensinou um ser humano a rezar e os dois viraram amigos. “É tipo eu e minha mãe. Eu estou ensinando uma coisa a ela e ela me ensina outra. Eu era novinho, ela me cuidava, eu cuidava dela. Ela dava um abraço em mim eu dava dois. Foi assim que nós começamos a nos amar”.
Sandra, aos 42 anos, está saindo da estatística dos adultos analfabetos no mundo. Segundo a Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura), existem 759 milhões de analfabetos no planeta: à espera de um anjo chamado Damião ou de políticas públicas para sua alfabetização para aprenderem a ler e escrever.
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Em Natal filho de 11 anos ensina mãe catadora de lixo a ler e escrever
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